Expedição Desertos Andinos

Me chamo Gerda Almeida, tenho 51 anos. Casada com Romulo Almeida que é meu maior incentivador no mundo do motociclismo, mãe do João Pedro e da Maria Fernanda, sou piloto há 1 ano e meio e junto com minha amiga Karina Pádua, 40 anos, piloto há dois anos, dividimos a maior aventura de nossas vidas: A Expedição Desertos Andinos. Minha moto é uma BMW F850 GS Adventure e a da Karina é uma HD Road Glide.

Nós duas fazemos parte do Motogrupo Ladies of the Road.

Ao longo de quase dois anos desenvolvemos o planejamento com estudos de rotas, pontos de interesse, locais de abastecimento e possíveis pernoites, após maratonar canais de motociclistas viajantes, conversar com amigos e cumprirmos uma sequência de viagens nacionais preparatórias com quilometragem crescente, colocamos nosso sonho em prática. O Romulo e o experiente amigo Claudinho nos acompanharam na viagem.

O planejamento inicial era percorrer parte da Argentina, Bolívia e Chile com ênfase no Salar de Uyuni e Deserto do Atacama, daí o nome da expedição Desertos Andinos.

Os cuidados como revisão, troca de pneus, instalação de equipamentos adicionais, aquisição de kit de ferramentas e reparos básicos, além de equipamentos de pilotagem adequados foram itens criteriosamente respeitados.

Uma dica importante, foi a atenção com o preparo físico, pois enfrentaríamos situações extremas e longas jornadas.

Atravessamos quatro países, rodamos 13.500Km, pegamos temperaturas que variaram de 4°C a 43°C, rajadas de vento de 40 Km/h, altitudes de 0 a 4835 m, chuvas torrenciais que levaram nosso corpo à exaustão e fomos forçadas a mudar nosso planejamento de viagem em virtude do fechamento de fronteira, ocasionado por grande nevasca. Mas isso nos fez superar limites, além de nos mostrar que estávamos no caminho certo, na busca de algo que nos dá muito prazer: pilotar nossas máquinas.

Saímos de Brasília dia 17/11/23, carregados de animação e adrenalina, com uma calorosa despedida da família, que tem papel fundamental com o apoio e incentivo carinhoso.

Já no primeiro dia, o calor de 42°C, o intenso trânsito de caminhões e as más condições do pavimento na BR 153 nos fez parar antes do planejado, percorrendo apenas 800 Km dos 1000 Km previstos.

No dia seguinte pilotamos até Foz do Iguaçu, pela bela rodovia Assis Chateubriand, sendo brindados com um belo pôr do sol na chegada. A expectativa de cruzar a 1ª fronteira no dia seguinte, era visível em nossos semblantes. Entramos na Argentina e percorremos a Ruta Nacional (RN) 12, passando por Posadas e Corrientes até Resistência.

O Chaco nos surpreendeu pela temperatura agradável na travessia, o que ia de encontro com tudo que já tínhamos lido sobre o escaldante calor daquela região. Ao sairmos de Salta/ARG, optamos por pilotar na Ruta 9 Antiga, estrada estreita com paisagens de tirar o fôlego, até Purmamarca/ARG, onde pudemos admirar o Serro de Los Siete Colores.

No 6° dia, atravessamos a 2ª fronteira. Entramos na Bolívia por Villazón (trâmites aduaneiros burocráticos e demorados). Nesse dia, chegamos a 4200 m de altitude, com direito a forte chuva, ventania e tempestade de raios em estrada bastante sinuosa. Para completar o desafio, na chagada a Uyuni, enfrentamos uma forte tempestade de areia, que mesmo com o capacete fechado, tivemos que saborear vários grãos. Valeu muito à pena. Que lugar maravilhoso! A imensidão branca do infinito deserto de sal, por mais que crescesse em nossos olhos, dava-nos a impressão de ser uma pintura. De fato, estávamos a contemplar uma obra esculpida pelo tempo há milhares de anos. O Monumento Dakar, a Praça das Bandeiras e a Isla Incahuasi são paradas obrigatórias para quem visita o Salar de Uyuni. Primeiro objetivo da viagem concluído.

Retornamos a Purmamarca para fazermos a travessia ao Chile pelo Paso Jama, passando pela Cuesta de Lipan com curvas fechadas e visual estonteante, Salinas Grandes, até chegar em San Pedro de Atacama, que nos brinda com a visão inconfundível do Vulcão Licancabur. Além do frio, essa travessia teve a maior altitude alcançada na expedição, 4835 metros. Estávamos no Deserto do Atacama, nosso segundo objetivo conquistado. Já havíamos ido àquele lugar, mas chegar de moto foi inusitado e nos trouxe outo tipo de emoção, completamente diferente da primeira vez. Nos 3 dias em San Pedro, visitamos locais como Piedras Rojas, Geisers Del Tatio e Lagunas Cejar, além da boa culinária local. Para coroar nossa estadia, presenciamos o famoso céu estrelado do deserto com uma linda noite de lua cheia.

No dia seguinte, partimos para outro objetivo. Seguimos para Tocopilla e descemos a Ruta 1, margeando o oceano Pacífico até Antofagasta, onde La Portada é um ponto alto e de tirar o fôlego! Seguindo viagem, alguns quilômetros à frente, ela estava lá, diante de nossos olhos, a famosa Mão do Deserto. Ela é realmente linda! Perdida em meio ao mais absoluto nada e objeto de desejo de muitos motociclistas. Nesse momento, um turbilhão de pensamentos invade nossa cabeça, pois alcançamos o mais seco e mais alto deserto do mundo, um lugar inóspito e longe. Mais uma conquista da grande jornada.

Nos dias seguintes, fomos até Viña Del Mar, de onde partiríamos para cruzar o Paso Los Libertadores e iniciar o caminho de volta. O que em princípio parecia um longo deslocamento, mudou. Encontramos motociclistas chilenos que nos sugeriram um caminho alternativo passando pelo Parque Pan de Azúcar. Que grata surpresa! Sugerimos fortemente que copiem a dica. As caletas no caminho nos encantaram e marcaram essa viagem.

Uma nevasca na noite anterior fez as autoridades fecharem o Paso por alguns dias, sem a certeza de quando seria reaberto. Nesse momento, resolvemos deixar de lado nosso planejamento e seguir novo percurso, que seria moldado no decorrer do caminho. O objetivo agora, era chegar à Argentina. Rumamos ao sul em direção a Puerto Varas para atravessar pelo Paso Cardenal Samoré. A mudança nos possibilitou visitar o vulcão de Osorno com seu pico nevado que pôde ser alcançado via teleféricos. O Parque Nacional Vicente Pérez Rosales e os saltos do Rio Petrohue com águas verde esmeralda e uma transparência sem igual e fizemos um compromisso no quilômetro zero da Carretera Austral para voltarmos lá para fazê-la por completo. E mais uma viagem entrou para o nosso roteiro!

Após voltarmos para a Argentina percorremos a Ruta dos Sete Lagos e seguimos em direção ao Oceano Atlântico passando por Bahía Blanca em direção a Buenos Aires onde fizemos a revisão das motos.

De Buquebus, atravessamos o Rio da Prata em direção a Colônia Del Sacramento, Montevideo e Punta Del Este onde vimos a escultura La Mano, cujo artista é o mesmo que fez a Mão do Deserto. Dessa forma, fizemos além do que tínhamos planejado. A Expedição Desertos Andinos agora ganhou um trajeto bioceânico.

A entrada pelo Chuí nos fez conhecer o extremo sul brasileiro, mas todo o estado foi atravessado debaixo de chuvas torrenciais com baixa visibilidade, muita água acumulada nas rodovias por problemas de drenagem e forte ventania na Reserva do Taim.

A partir de Santa Catarina até Brasília, pegamos muito calor com máxima de 43°C.

Durante todo o percurso internacional encontramos boas estradas, atendimento cordial e em nenhum momento, pelos países que passamos, enfrentamos situação perigosa tampouco, abordagem policial com intuito de extorsão.

À medida que nos aproximávamos de casa, a vontade ver os filhos era enorme ao mesmo tempo que vinha o filme de todo o percurso feito, das oportunidades e desafios vencidos, mas também batia a tristeza por estarmos finalizando a experiência mais desafiadora de nossas vidas, afinal, foram 29 dias com nossas máquinas na estrada, quatro países e estreita convivência de quatro pessoas que tinham se transformado em admiradores uns dos outros. Durante esse tempo, meu esposo Romulo e nosso amigo Claudinho foram incansáveis no apoio da longa jornada.

Sim. As lágrimas vieram e traduziam toda a emoção daquele momento, com direito a bradarmos gritos de “VENCI”, “CONSEGUI” e “OBRIGADA MEU DEUS” dentro dos nossos capacetes.

Que venha a Expedição Ushuaia 2024. Estamos prontos.

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